2.4.09

Trabalho de menino


Naquele tempo
(supostamente)
Não existia
A culpa

Bastava ficar sobre a ponte
E observar o aparecer intermitente
Na superfície da água

Os miados
Iam se tornando raros
E mais uma ninhada
Seguia
Rio abaixo

Um comentário:

Rui disse...

Marcos!
Não sei que idade tinha. Era no tempo das lembranças mais antigas preservadas da infância. Além de cachorros tinhamos gatos. Naquela época de truculência bruta os filhotes eram sacrificados, sem chances de vida. Os pais não o faziam, mandavam os filhos. Meu irmão era o matador oficial de cães e gatos quando ficavam inconvenientes: velhos e doentes. Os matava com um tiro de espingarda. Ele odiava fazer isto , mas era obrigado.
A gata teve filhotes. Alguém dos pais mandou que fossem afogados. Lembro que desci até o riacho acompanhado pela minha irmã, os gatinhos numa cesta, queria brincar um pouco mais com eles.
O local escolhido era próximo de uma fonte de água fresca, numa curva de aguas calmas e transparentes. Os gatinhos foram jogados ali, um a um, se debatiam na água sem saber nadar, as bolhas de ar subindo através da água e sumindo lentamente, os últimos movimentos deles, lentos.
Sinto uma profunda tristeza e culpa de ser criança com nenhum poder de decisão. Mesmo sabendo que é a idadade da inocência. a culpa e a impotência estão ali. O pecado original do cristianismo.
São marcas na alma que não se apagam e lançam suas longas cordas de fantoche até os dias de hoje
Para mim, naquele tempo existia muita culpa.